Cidadania também é para fazer juntos!

CIDADANIA TAMBÉM É PARA FAZER JUNTOS!

Associação é para fazer juntos. O título desta publicação, lançada pelo IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil, no início de dezembro de 2011, já exprime o que será tratado em seus capítulos: que a criação de uma associação deve ser resultado de um processo coletivo e sua atuação deve ser marcada também pela participação efetiva de seus associados.


É o resultado de 10 anos de trabalho com organizações comunitárias e regionais indígenas, quilombolas, de ribeirinhos, agricultores familiares e outros, aprofundando e atualizando o que já foi publicado anteriormente em Gestão de associações no dia-a-dia.

Este blog nasceu como um espaço para troca de conhecimentos e experiências de quem trabalha para o desenvolvimento de organizações comunitárias e outras.

A partir de 2018 passou a ser também um espaço para troca de ideias e experiências de fortalecimento da cidadania exercida no dia-a-dia, partilhando conhecimento e reflexões, produzindo e disseminando informações, participando de debates, dando sugestões, fazendo denúncias, estimulando a participação de mais pessoas na gestão das cidades onde vivem.

Quem se dispuser a publicar aqui suas reflexões e experiências pode enviar para jose.strabeli@gmail.com. Todas as postagens dos materiais enviados serão identificadas com o crédito de seus autores.

É estimulada a reprodução, publicação e uso dos materiais aqui publicados, desde que não seja para fins comerciais, bastando a citação da fonte.

José Strabeli




segunda-feira, 30 de junho de 2014

A lógica dos projetos e o desenvolvimento comunitário

A elaboração de um projeto pode ir muito além do pedido de um financiamento e cabe aos consultores e técnicos de organizações que apoiam as associações comunitárias desvendar (tirar o véu, revelar) a sua linguagem técnica e a sua lógica para as lideranças e tornar este um momento importante para o desenvolvimento comunitário e de suas associações.


Isso se considerarmos a elaboração do projeto em seu ciclo de vida e não só o momento da elaboração. Nos dias 21 a 27 de junho realizamos o Módulo II da Oficina de Elaboração de Projetos no Parque Indígena Xingu. Promovido pelo Instituto Socioambiental – ISA e a Associação Terra Indígena Xingu – ATIX, reuniu 15 lideranças de 5 associações.

No Módulo I, conforme postagem feita em maio, trabalhamos com o Diagnóstico e o Planejamento, as duas primeiras fases do Ciclo de Vida de um projeto. Foi dada ênfase na participação comunitária para o levantamento e priorização dos problemas, o aprofundamento do conhecimento de suas causas e efeitos através de metodologias de Diagnóstico Rápido Participativo – DRP e também do planejamento, elaborado em uma matriz. Para a sua elaboração foi destacada a importância das conversas nas comunidades para que ficassem claros os objetivos, os resultados a serem alcançados, que fosse decidido em conjunto a melhor estratégia a ser adotada, o envolvimento de pessoas da comunidade para a execução das atividades e os parceiros com quem se poderia contar.


Neste contexto, a elaboração do projeto passa a ser a forma, muitas vezes necessária, de  viabilizar os recursos para executar uma estratégia de ação coletivamente pactuada e também de definir outros elementos importantes para a sua execução. A parte mais importante do projeto deixa de ser o orçamento e “as coisas” para comprar e passa a ser as atividades a serem realizadas, os objetivos e resultados a serem alcançados, o problema que se quer resolver ou diminuir.

Sendo assim, a elaboração do projeto na oficina começou pela Matriz de Planejamento, que já tinha sido feita na fase anterior: o problema identificado foi transformado no Objetivo Geral; as suas causas nos Objetivos Específicos que, uma vez alcançados, contribuem para o Objetivo Geral, tanto quanto as causas contribuem para a existência do problema; os Resultados Esperados são os compromissos que a associação assume em relação aos Objetivos Específicos, nem sempre atingidos durante o período de financiamento, identificados com os efeitos que o problema causa. Para cada Resultado Esperado é definido um indicador de que ele foi alcançado ou não. Para isso é necessário que atividades sejam realizadas e cada atividade necessita de recursos para a sua realização, que vão constar no orçamento.

A descrição do problema, suas causas e efeitos, levantados no diagnóstico, trazem as informações necessárias para o Contexto. De que maneira esse problema será resolvido ou diminuído com a execução do projeto é descrito na Justificativa. A comunidade deve estar organizada e preparada para a execução das atividades e a maneira como vão trabalhar juntos é descrita na Metodologia. Como vão distribuir essas atividades no tempo disponível é demonstrado no Cronograma. Por fim, a Apresentação, descreve o histórico da associação e a sua atuação anterior com relação ao problema abordado no projeto, sua capacidade gerencial e política, suas parcerias.

Isso feito passo a passo, com o tempo necessário para a elaboração em grupos, seguido de troca de experiências e comentários, foi muito produtivo.

Já tive a oportunidade, não só no Xingu, mas também em outros lugares, de observar como esse processo leva a um maior envolvimento e empoderamento das comunidades, uma maior aproximação da direção da associação com sua base, dando-lhe mais legitimidade e sentido ao “estar juntos” em uma organização. É um momento privilegiado que não deveria ser negligenciado ou desvalorizado como tem sido.

Claro que esta não é uma tarefa fácil. Se até os técnicos têm dificuldades para pensar tantas coisas previamente, ainda mais com uma lógica pré definida, pessoas com pouca familiaridade com a escrita, com “a lógica Cartesiana”, terão ainda mais. No entanto, há formas de tornar esse caminho mais fácil de ser trilhado e esta é a nossa missão. O que não podemos é “jogar a criança fora junto com a água do banho” e deixar de aproveitar a oportunidade de planejar com mais acuidade, de envolver as pessoas nesse processo, de usar os recursos com mais eficiência e de tornar as ações mais eficazes.

Chamou a atenção durante a leitura de alguns editais ao final da oficina, que os financiadores estão cada vez mais exigindo contrapartida das comunidades e parceiros, participação comunitária em todas as fases do projeto, desde o diagnóstico até a avaliação de sua execução e que os projetos não sejam assistencialistas, “dando coisas”, mas que eles contribuam para as iniciativas comunitárias e tenham continuidade depois do período de financiamento. O presidente de uma das associações me perguntou no início da oficina qual o tipo de projeto que poderia ser elaborado pelos diretores, sem conversar com a comunidade: “Aqueles que serão mal elaborados e não darão certo.”
 
Depoimentos dos participantes da oficina mostram que entenderam a mensagem e estão dispostos a fazer diferente:

Me mostrou como elaborar projeto, a levantar os problemas, aprendi a diagnosticar as necessidades. Assim é, talvez, mais rápido você elaborar o projeto.


Eu entendi melhor os passos de como elaborar um projeto e ficou muito claro que não se deve elaborar projeto sem a participação da comunidade.

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