Já
comentamos algumas vezes sobre a dependência financeira de muitas associações
em relação a financiadores de projetos, como é um erro criar uma associação
apenas para captar recursos, etc. Hoje quero partilhar com vocês uma
experiência muito interessante de como a elaboração de projetos pode levar a
associação a se repensar, rever suas estratégias de ação e os
resultados que vem alcançando. Isso me levar a crer que os financiadores também
têm um papel importante para o desenvolvimento organizacional das instituições
que financia.
Recentemente
dei consultoria para uma associação comunitária do Pará para a elaboração de um
projeto, respondendo a um edital de demanda espontânea.
Chamou a
atenção alguns requisitos exigidos pelo financiador, como uso criativo dos
recursos comunitários; participação significativa dos beneficiários na
identificação do problema, método escolhido para resolvê-lo, formulação do
projeto, execução e avaliação das atividades; contrapartida da associação, dos
beneficiários e de organizações parceiras; parcerias com o governo, empresas e
sociedade civil; potencial para fortalecer as organizações envolvidas e
melhorar a capacidade de autogovernança; potencial para gerar aprendizado e
resultados mensuráveis.
A
associação com a qual eu trabalhava, preocupada em captar recursos para suas
despesas institucionais e prover as comunidades de sua base com bens de
consumo, percebeu logo que projeto não é apenas uma forma de se “ganhar
dinheiro”, mas é uma proposta de trabalho, que deve ser realizada por todos,
juntos, desde a discussão do problema até sua avaliação; que a associação não
pode ficar isolada, precisa buscar parceiros; que financiadores apostam em boas
propostas e financiam o que a comunidade não tem, mas quer que ela, em
contrapartida, disponha daquilo que tem como mão de obra, matérias primas,
alimentos, etc.
Algumas
informações pedidas no formulário sobre a associação levaram os dirigentes e
lideranças a repensar o que a organização tinha sido até aquele momento e o que
pretendia ser dali para frente: missão, estrutura de gestão, estrutura
operacional, o que já tinha realizado, inclusive com relação ao objetivo do
projeto.
Suas
práticas também foram colocadas em cheque com algumas perguntas sobre as
comunidades e o projeto:
- Como os membros da comunidade ou grupos representados participarão do projeto?
- Já trabalharam juntos no passado? Como e por quê?
- Como este enfoque foi determinado e quem participou?
- Que parceiros ou organizações participarão deste projeto e o que se comprometeram a contribuir?
- Indique os resultados previstos, tanto imediatos como de longo prazo. Como você saberá se os alcançou? Como você os medirá?
- O que torna seu projeto inovador ou diferente?
- Explique por que o projeto é viável.
- Indique possíveis desafios para o projeto e como sua organização os abordará.
- Como as atividades continuarão uma vez terminado o financiamento?
Não
duvido que a primeira reação de muitas pessoas seria dizer que o financiador é
muito exigente e com isso inviabiliza o financiamento para organizações
pequenas, especialmente as comunitárias.
Essa é
uma maneira de encarar os projetos, que leva a propostas mal formuladas ou “com
aquilo que o financiador quer ouvir” e que ao final poucos benefícios reais
levam às comunidades, muitas vezes deixando um rastro de problemas atrás de si.
Outra
maneira de encarar, que eu prefiro, é tomar isso como aprendizado: elaborar
projetos não é tão fácil como pode parecer para quem não tem experiência e
ouviu falar que é fácil; a associação precisa estar preparada para executar um
projeto; precisa ter clareza do problema que quer resolver, como fazê-lo, como
monitorá-lo e como avaliá-lo; precisa ter um trabalho enraizado na comunidade
para que as pessoas participem do projeto desde a sua elaboração e dêem continuidade
às atividades depois de terminado o financiamento.
Um
projeto entendido desta forma, mais do que um valor em dinheiro, é uma proposta
de trabalho, é um sonho partilhado entre financiador e financiados, cada qual
dispondo daquilo que têm para que seja alcançado.
Financiadores
assim contribuem para o desenvolvimento organizacional. Não geram dependência,
mas colaboram para a soberania. “Promovem” as comunidades da posição de
carentes para a de comunidades com potencial que precisam de investimento.
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