Cidadania também é para fazer juntos!

CIDADANIA TAMBÉM É PARA FAZER JUNTOS!

Associação é para fazer juntos. O título desta publicação, lançada pelo IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil, no início de dezembro de 2011, já exprime o que será tratado em seus capítulos: que a criação de uma associação deve ser resultado de um processo coletivo e sua atuação deve ser marcada também pela participação efetiva de seus associados.


É o resultado de 10 anos de trabalho com organizações comunitárias e regionais indígenas, quilombolas, de ribeirinhos, agricultores familiares e outros, aprofundando e atualizando o que já foi publicado anteriormente em Gestão de associações no dia-a-dia.

Este blog nasceu como um espaço para troca de conhecimentos e experiências de quem trabalha para o desenvolvimento de organizações comunitárias e outras.

A partir de 2018 passou a ser também um espaço para troca de ideias e experiências de fortalecimento da cidadania exercida no dia-a-dia, partilhando conhecimento e reflexões, produzindo e disseminando informações, participando de debates, dando sugestões, fazendo denúncias, estimulando a participação de mais pessoas na gestão das cidades onde vivem.

Quem se dispuser a publicar aqui suas reflexões e experiências pode enviar para jose.strabeli@gmail.com. Todas as postagens dos materiais enviados serão identificadas com o crédito de seus autores.

É estimulada a reprodução, publicação e uso dos materiais aqui publicados, desde que não seja para fins comerciais, bastando a citação da fonte.

José Strabeli




segunda-feira, 20 de maio de 2013

Organizações informais são legítimas e reconhecidas?



Nos dias 14 a 17 deste mês fui convidado pelo Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena para moderar a elaboração do Regimento Interno do Conselho de Caciques dos Povos Indígenas de Oiapoque – CCPIO, no Centro de Formação da Aldeia Manga, em Oiapoque, no Amapá. Com o formato atual, o CCPIO existe desde 2011, mas, segundo os próprios indígenas, é uma retomada do modelo tradicional de organização política. Há registros da existência e atuação do conselho desde os anos 1970.

Os caciques decidiram que, pelo menos por enquanto, o Conselho não terá personalidade jurídica. Daí decidirem pela elaboração de um Regimento Interno, que sistematizasse e documentasse a sua composição, forma de funcionamento e relação com as associações indígenas. Participaram da atividade 18 caciques e dirigentes de associações dos povos Karipuna, Palikur, Galibi Marworno e Galibi Kali’na, das Terras Indígenas Uaçá, Galibi e Juminã, totalizando 24 pessoas, com o apoio de representantes do Iepé e da The Nature Consevancy – TNC.

O Conselho é formado por um cacique de cada uma das 39 aldeias, mais 5 lideranças escolhidas pelos caciques pela relevância que podem ter seus conhecimentos e experiências, todos com direito a voz, votar e ser votados. Os diretores das associações são convidados para as reuniões do CCPIO com direito a voz.

Foram definidos como objetivos:

I – Estabelecer diretrizes e normas para a gestão territorial das terras indígenas: vigilância e fiscalização do território, utilização dos recursos naturais, proteção ambiental, atividades econômicas, etc.;
II – Monitorar e definir encaminhamentos para a execução do Plano de Vida dos Povos Indígenas de Oiapoque, bem como os programas e projetos dele decorrentes;
III - Representar o movimento indígena de Oiapoque em outras instâncias do movimento indígena nacional e internacional;
IV – Defender os direitos indígenas e apresentar reivindicações aos órgãos governamentais em questões gerais das Terras Indígenas de Oiapoque;
V – Orientar e apoiar as associações na busca por parcerias, recursos, projetos e reivindicações aos órgãos do governo em questões específicas às suas áreas de abrangência;
VI – Fiscalizar e cobrar a realização das atividades sob a responsabilidade das associações e comunidades indígenas;
VII – Apreciar, em conjunto com as organizações indígenas, as solicitações de pesquisa junto aos povos indígenas de Oiapoque, respeitadas as normas e exigências legais;
VIII – Apreciar, em conjunto com as organizações indígenas, as propostas de programas e projetos, governamentais e privados, a serem desenvolvidos junto aos povos indígenas de Oiapoque;
IX – Representar os povos indígenas de Oiapoque em reivindicações e negociações transfronteiriças.
Ao final da elaboração do Regimento perguntaram se o CCPIO precisaria ter CNPJ para ser reconhecido pelo governo e organizações privadas. Ponderamos que uma organização só precisa ser formalizada se for assinar contratos, movimentar conta bancária, emitir nota fiscal e outros compromissos legais. O Conselho já tem o reconhecimento dos povos indígenas do Oiapoque; de organizações que trabalham com eles, como o Iepé e TNC e de algumas instâncias do governo, como do Estado do Amapá. Se uma organização informal, de modelo tradicional, é reconhecida pelos povos que a criaram, deve ser também reconhecida fora da Terra Indígena. Disseram que algumas instâncias de governo nem recebem para conversar se não for pessoa jurídica. As comunidades, inclusive as indígenas, precisam ensinar ao governo e às organizações privadas a reconhecerem as organizações informais legitimadas por sua base. Se não sabem que uma organização do movimento social, legitimada por aqueles que a criaram e os que ela pretende mobilizar e representar, deve ser reconhecida também pelos órgãos governamentais e não governamentais, precisam aprender. Para que formalizar e burocratizar todas as relações, onerando as comunidades com todos os encargos que uma associação formalizada exige? Pediram apoio aos parceiros para divulgar o CCPIO para contribuir para o reconhecimento por parte de outras organizações e instâncias do governo. Aqui está a contribuição que me comprometi com eles a dar.

Na mesma semana refletimos sobre as associações formalizadas. Além dos dirigentes de cinco dessas organizações, participaram também os caciques, demonstrando claramente a integração que desejam continuar imprimindo entre o CCPIO e as associações. Atualmente há seis organizações desse tipo, além de uma cooperativa de transporte, criadas pelos índios de Oiapoque. Falamos de sua importância como organização social, que deve ser uma ferramenta de trabalho para que, juntos e dividindo tarefas, possam lutar pelas condições necessárias para viverem bem em suas terras com autonomia e protagonismo, valorizando suas potencialidades e aproveitando as oportunidades oferecidas por parceiros e financiadores. Falamos também que não se pode descuidar dos compromissos fiscais e legais, lembrando que Associação é como curumim que você faz na sua esposa: precisa cuidar bem desde o processo de criação, deixar os documentos em dia, tomar todas as providências para que ela cresça forte.

Refletimos sobre as dificuldades que as associações têm enfrentado para a sua sustentabilidade financeira, em especial por causa de dependência de recursos de projetos, programas governamentais, etc., ressaltando que Precisamos devolver as associações para os movimentos sociais. Despertou bastante interesse a fábula africana sobre a águia e a galinha, lida na postagem Sobre águias, galinhas e associações. Uma das lideranças disse que lembrou de uma história ancestral onde Deus perguntou aos diferentes povos o que queriam e os índios responderam que não precisavam de nada. Só queriam ser livres. Na avaliação, uma “cacica” disse que tinham aprendido bastante, mas precisavam aprender mais: Vamos ter asas para voar e não ficar só no galinheiro comendo milho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário