Cidadania também é para fazer juntos!

CIDADANIA TAMBÉM É PARA FAZER JUNTOS!

Associação é para fazer juntos. O título desta publicação, lançada pelo IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil, no início de dezembro de 2011, já exprime o que será tratado em seus capítulos: que a criação de uma associação deve ser resultado de um processo coletivo e sua atuação deve ser marcada também pela participação efetiva de seus associados.


É o resultado de 10 anos de trabalho com organizações comunitárias e regionais indígenas, quilombolas, de ribeirinhos, agricultores familiares e outros, aprofundando e atualizando o que já foi publicado anteriormente em Gestão de associações no dia-a-dia.

Este blog nasceu como um espaço para troca de conhecimentos e experiências de quem trabalha para o desenvolvimento de organizações comunitárias e outras.

A partir de 2018 passou a ser também um espaço para troca de ideias e experiências de fortalecimento da cidadania exercida no dia-a-dia, partilhando conhecimento e reflexões, produzindo e disseminando informações, participando de debates, dando sugestões, fazendo denúncias, estimulando a participação de mais pessoas na gestão das cidades onde vivem.

Quem se dispuser a publicar aqui suas reflexões e experiências pode enviar para jose.strabeli@gmail.com. Todas as postagens dos materiais enviados serão identificadas com o crédito de seus autores.

É estimulada a reprodução, publicação e uso dos materiais aqui publicados, desde que não seja para fins comerciais, bastando a citação da fonte.

José Strabeli




domingo, 30 de setembro de 2012

Oficina sobre Gestão de Associações em Humaitá



Nos dias 24 a 27 de setembro contei com apoio de Aurélio e Cassiano, assistentes de campo do IEB em Humaitá, no sul do Amazonas, para facilitar uma Oficina sobre Gestão de Associações naquela cidade. Participaram 28 diretores e lideranças de seis associações e da Comunidade Mirari, que está em fase de fundação de sua associação.

Foi tratado o papel e importância de uma associação, dando ênfase para a participação dos associados e a valorização das potencialidades das comunidades para a resolução de seus problemas, além de aproveitar as oportunidades oferecidas por parceiros, órgãos governamentais e financiadores.

Também foi ressaltada a importância da definição clara de objetivos que sejam relevantes para aquelas famílias para que sejam estimulados a se organizarem na associação. "Fundar uma associação e não ter objetivos claros é como entrar em um taxi e não saber para onde vai." O estatuto foi valorizado como a "constituição da associação", que deve conter, além dos objetivos, a estrutura e o funcionamento da associação de acordo com o que for definido pelos associados, depois de ampla discussão. O trecho do Código Civil Brasileiro foi mostrado e explicado para os presentes para que verificassem o espaço que a legislação deixa em aberto para que organizem a associação de acordo com seus objetivos e forma de organização. Os participantes se interessaram em continuar conhecendo melhor seu estatuto, discutir nas comunidades e reformarem no que julgarem necessário, depois de anos em que ele figurou apenas como uma peça formal para o registro da associação.

A organização interna, com diretores, conselheiros e associados organizados e atuantes, cada um com suas atribuições, além das exigências legais para a manutenção da associação também ganhou destaque. Em grupos, leram em cópias de seus estatutos quais são os órgãos de administração e suas atribuições, compararam com o que vem sendo feito na prática e discutiram formas de melhorar o funcionamento e a comunicação entre esses órgãos. Foi feito exercício para a elaboração de relatórios financeiros, a serem utilizados para a gestão dos recursos, contabilidade e prestação de contas para a Assembléia Geral.

Também despertaram o interesse nos participantes as técnicas de diagnóstico e planejamento participativos para que a atuação dos associados comece com a discussão de seus problemas, o planejamento das ações para resolvê-los, o monitoramento para a implementação satisfatória do que foi planejamento e a avaliação focada nos resultados alcançados.

Na avaliação, todos os participantes expressaram a importância da aquisição desses conhecimentos para o desenvolvimento de suas associações, a disposição em transmitir o que aprenderam para suas comunidades e a utilização no seu trabalho. Demonstraram também a expectativa de continuarem esse trabalho de desenvolvimento de suas organizações.

Também na Comunidade Nova Xioma Associação é para fazer juntos



Estive novamente em Boca do Acre, no sul do Amazonas, nos dias 17 a 21 de setembro, para dar continuidade ao trabalho de desenvolvimento organizacional de 12 associações de trabalhadores agroextrativistas, desta vez para fazer o diagnóstico organizacional juntamente com dirigentes daquelas organizações.

Chamou a atenção o relato das atividades da Associação dos Produtores Rurais da Comunidade Nova Xioma feito pelo seu presidente, Mário Souza da Cruz. Depois de atuar nos últimos anos no Conselho Fiscal, foi eleito em julho deste ano para o cargo de presidente.

Segundo Mário, moram nessa comunidade tradicional 42 famílias, que vivem da produção de castanha, extração de látex, farinha de mandioca, feijão, arroz, criação de porcos e galinhas, além de outros produtos da roça.

Relatou que nos seus anos de trabalho na associação, aprendeu que ao planejar atividades não se pode deixar indefinido quem serão os responsáveis: “Dizer que é para todo mundo trabalhar, não acontece. Combinar que metade trabalhará em um dia e a outra metade em outro, também não funciona. É preciso definir o nome de cada um que se propõe a ajudar naquela atividade. É preciso escrever o que vai ser feito, quem vai fazer e quando.”

De acordo com ele, a nova diretoria está entrosada e todos trabalhando para a associação funcionar bem. “O secretário está procurando compradores para os nossos produtos. Em toda reunião da diretoria, que acontece no último domingo do mês, tem coisa nova para contar.”

A Associação Nova Xioma faz parte do Fórum de Desenvolvimento Sustentável de Boca do Acre, que tem focado sua atuação na regularização fundiária através da Secretaria do Patrimônio da União e do Programa Terra Legal. Antes de ser feito o estudo pelos órgãos governamentais, reuniram-se para definir entre eles um plano de uso da terra para apresentar aos técnicos, evitando assim que desentendimentos entre eles prejudicassem o andamento do processo de regularização.

Ganharam uma caminhonete usada e, para apressar a doação, se propuseram e fizeram uma cotização entre eles para o conserto. Para a construção da escola, contaram com a doação de materiais pela prefeitura e a comunidade entrou com a madeira e a mão de obra. Divididos em grupos, se encarregaram da construção.

Estão negociando um empréstimo bancário para a compra de equipamentos agrícolas, para aumentar sua produção para a geração de renda. Como uma experiência piloto, um grupo de 10 produtores está plantando 1 hectare de banana e 1 de abacaxi. A produção deverá ser comercializada pela associação. Dessa forma terão melhores condições para negociar o preço, a forma de pagamento e escoamento, além de gerar recursos para a manutenção de sua organização.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

E quem vai fazer? Esse menino aí...


Nos dias 03 a 09 de setembro, junto com Rachel Lange, assistente de campo do IEB, acompanhados por Valdecy, recém empossado presidente da Associação dos Moradores e Amigos da RDS do Juma - AMARJUMA, em Novo Aripuanã, sul do Amazonas, realizamos mais uma etapa do Diagnóstico e Planejamento Participativos da associação. Fizemos 4 reuniões com representantes de 7 comunidades do Rio Aripuanã.

Em cada reunião, antes de iniciar o diagnóstico foi falado sobre os objetivos e funcionamento de uma associação, dando ênfase para a participação dos associados. Utilizamos a metáfora sugerida por uma liderança indígena da Associação Doá Txatô, em Alta Floresta – RO, da associação funcionando como um corpo. Ela tem se mostrado uma forma bastante eficaz para os associados entenderem que a associação não é só o presidente, que deve resolver todos os problemas, mas sim os associados trabalhando juntos para atingir seus objetivos. Ajuda também a entender que o trabalho dos associados deve ser organizado, por exemplo, em grupos por atividades nas comunidades, além de dividirem com a diretoria a participação em reuniões para a discussão de temas relevantes e as tarefas administrativas. Cabe à diretoria, que é “a cabeça”, identificar as pessoas com potencial e disposição, mobilizar e organizar essas pessoas para trabalharem juntas, afinal dividir tarefas também é fazer juntos.

Os problemas foram discutidos, algumas vezes em grupos, dependendo do número de pessoas, priorizados e transformados em objetivos: O que vocês pretendem fazer com os recursos da RDS para viverem felizes aqui? Atividades, recursos, prazos, responsáveis e parceiros foram definidos coletivamente.

Em vários momentos do planejamento, quando perguntados sobre quem era o responsável por realizar as atividades para atingir determinado objetivo, lembravam: É esse menino aí. Os associados trabalhando juntos.

Nas avaliações destacaram a importância de serem ouvidos sobre os problemas que enfrentam e como devem ser solucionados. Também ficou claro que devem valorizar as potencialidades das comunidades para a solução de seus problemas e melhorias que pretendem conseguir. Devem aproveitar as oportunidades que podem ser oferecidas por parceiros e financiadores, de forma complementar aos seus próprios meios, mas não podem ficar esperando só por isso. Ao reivindicar políticas públicas do governo, não devem apenas entregar um documento e ficar esperando indefinidamente por uma resposta. Devem ser criativos na elaboração de estratégias e persistentes. Lembrando a clássica música de Chico Buarque: Ouça um bom conselho / Que lhe dou de graça / Inútil dormir que a dor não passa. / Espere sentado ou você se cansa. / Está provado, quem espera nunca alcança.


Os planos propostos nessas e reuniões e nas outras realizadas em julho serão sistematizados. Em reunião a ser realizada no início de outubro com os conselheiros de setor, será complementado e validado para dar origem ao Plano de Ação da associação.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Os limites dos cursos e oficinas para o desenvolvimento organizacional


Como tem sido relatado em várias postagens, nos últimos meses tenho me dedicado à realização de diagnósticos organizacionais com diretores, conselheiros e outras lideranças da associação e a processos participativos de diagnóstico e planejamento nas comunidades. Isso se deve a uma proposta metodológica que visa estimular a participação dos associados nos diferentes momentos da vida das associações considerando que ela é uma ferramenta para se trabalhar juntos. A proposta vai de encontro também ao entendimento de que “o trabalho de desenvolvimento organizacional visa o aprimoramento das capacidades internas, a melhoria das práticas de planejamento, monitoramento e avaliação, visando o alcance da missão e dos objetivos da associação.” (Andrade, Roberta Amaral (org.) – Organização Social da Amazônia: uma experiência de associativismo na RDS do Rio Madeira, Brasília, IEB, 2011).

Vejo com satisfação que várias organizações que apóiam o desenvolvimento de associações comunitárias, regionais e étnicas aceitaram essa proposta, na contramão do forte movimento de muitos anos que privilegiou e, em muitos casos ainda privilegia, a captação de recursos através de projetos como elemento principal ou mesmo único para o “fortalecimento das associações”. Ela vai além dos cursos e oficinas, lançando mão também da “formação em serviço”, saindo dos escritórios e salas de curso para ir às comunidades.

Esta forma de trabalhar, para mim, foi se desenhando a partir da avaliação de um curso sobre gestão de associações dado há alguns anos em que vários dos participantes, dirigentes de associações, avaliaram que o curso foi muito bom, aprenderam coisas importantes, mas não se viam em condições de utilizar de imediato os conhecimentos e técnicas aprendidas em suas associações e comunidades. Precisavam de um acompanhamento técnico pelo menos por um tempo, até se familiarizarem mais com aqueles processos. Começamos, eu e o coordenador do curso, a pensar que cursos e oficinas servem mais como sensibilização para aspectos que não tinham conhecimento do que como capacitação no sentido do desenvolvimento de capacidades. Existe um espaço a ser vencido entre assimilar um conteúdo e conseguir colocá-lo em prática, adaptando-o às diferentes realidades ou situações que o dia a dia apresenta. Mesmo em atividades práticas nas oficinas, em geral, as questões colocadas são hipotéticas, nem sempre correspondendo às situações reais que serão enfrentadas no quotidiano. É muito maior ainda o espaço entre o aprender e o ensinar, objetivo de diversos processos que pretendem “formar multiplicadores”.

O que tem me chamado a atenção em vários lugares do Brasil, com diferentes populações e associações, apoiadas por diferentes organizações é que os participantes consideram todas as atividades até agora desenvolvidas como “aula”, que “estão lá para aprender”, porque “é muito importante adquirir novos conhecimentos e repassar para a minha comunidade”. Mesmo que eu explique diversas vezes que não se trata de curso, mas de uma reunião de trabalho; que não estamos fazendo exercícios, mas elaborando, por exemplo,  um diagnóstico e um planejamento que devem ser utilizados por eles, na avaliação “agradecem ao professor pelos conhecimentos transmitidos”.

Fico me perguntando e já conversei com algumas pessoas se isso não seria sinal de que os cursos e oficinas estariam sendo excessivamente utilizados como estratégia de desenvolvimento organizacional, supervalorizando a aquisição de conhecimentos em detrimento de outras estratégias e do desenvolvimento de capacidades que favoreçam mais efetivamente os resultados que se pretende alcançar. Também consideramos que “ser um bom aluno” exige menos do que se comprometer com as mudanças propostas ou as decisões tomadas. Terminado o curso, o “resultado esperado já foi alcançado”, já a implementação de um planejamento participativo, por exemplo, exige bem mais esforço para mobilização, gestão de conflitos, realização de atividades e avaliação de seus resultados durante um período mais longo.

O desafio é como reverter essa supervalorização da aquisição de conhecimentos que foi disseminada durante anos, demonstrar que aprender é bom, mas fazer é necessário para o desenvolvimento das associações e confrontar a teoria com a prática é a melhor escola.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Dividindo tarefas com o Conselho Administrativo


Como tem sido feito com outras associações nos últimos meses, na última semana de agosto, com o apoio de Marcelo Franco e Joedson Quintinho, assessores de campo do IEB, moderei reuniões de diagnóstico organizacional com diretores e conselheiros da Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas do Médio Purús – ATAMP e a Associação dos Produtores Agroextrativistas da Assembléia de Deus do Rio Ituxi – APADRIT, dando continuidade ao trabalho de desenvolvimento organizacional com associações de Lábrea, no sul do Amazonas.
 
Na RESEX do Médio Purus vivem 97 comunidades de trabalhadores agroextrativistas, agrupadas em 12 setores. A ATAMP tem em sua estrutura um Conselho Administrativo composto por um a três representantes de cada setor, dependendo do número de comunidades.

Os conselheiros disseram em uma reunião preparatória e durante o diagnóstico organizacional que não sabiam claramente quais eram as suas atribuições, sendo essa uma das razões para não estarem se reunindo. Verificamos no estatuto que este conselho tem atribuições relacionadas à gestão dos recursos financeiros e também de “estimular a organização social das comunidades.” Refletimos o que significava isso, como deveria ser dado esse estímulo e para que seria proposto que as comunidades se organizassem.

Já havíamos falado sobre a importância de dividir tarefas para não sobrecarregar a diretoria, para tornar as ações da associação mais participativas, potencializar a sua capacidade de trabalho e formar novas lideranças. Concluíram que a criação de grupos para a organização do trabalho nas comunidades seria a forma de estimular a organização das comunidades para a melhoria de sua qualidade de vida. Foi criado inicialmente o grupo de produtos agroextrativistas, que terá como função participar de discussões sobre o tema, informar as comunidades e organizar grupos e as atividades agroextrativistas nas comunidades da RESEX.

Como era a primeira experiência dos conselheiros nesse sentido, foi avaliado que seria precipitado criar vários grupos de uma vez. Com o amadurecimento da experiência deverão ser criados outros grupos como manejo de peixes, educação e saúde.

Sobre a fiscalização do uso dos recursos da associação, depois de um treinamento dos diretores, em especial o tesoureiro e seu vice, para a elaboração de controles financeiros, o grupo fiscal do Conselho Administrativo também será treinado em como analisar relatórios financeiros, comprovantes de receitas e despesas e extratos bancários. Também está programado realizar diagnóstico e planejamento participativos nas comunidades.