Em uma segunda-feira, às 9:30 da manhã
saí de casa para ir a uma Audiência Pública na Câmara Municipal de Itupeva. É,
estou aposentado e não precisava estar no trabalho. E acho importante
participar das coisas da cidade. O aviso que vi no perfil de um dos vereadores
em uma rede social era um tanto enigmático, “Compareça – Audiência Pública -
projeto de lei complementar nº 492, nº 494 e nº 495 – projeto de transformação
de área”, mas resolvi ir assim mesmo. Eu tinha perguntado para o mesmo vereador
na rede social do que se tratava e ele me respondeu que eram projetos para
transformar três áreas rurais do Bairro da Lagoa em áreas urbanas.
Na Câmara Municipal fui recebido por
funcionárias muito atenciosas, que me convidaram a entrar na galeria destinada
aos cidadãos alguns minutos antes de iniciar a audiência. Além de mim tinha
mais seis ou sete pessoas. Também, nesse horário, né? Está todo mundo
trabalhando...
Com a rápida apresentação do
representante da prefeitura – os projetos de lei eram de iniciativa do prefeito
– fiquei sabendo que as três áreas somavam pouco mais de 480 mil m2 e os
proprietários tinham interesse em fazer loteamentos ali. Essas áreas são suficientes
para trazer para a cidade mais 480 famílias, se forem feitos lotes de 1.000 m2,
como onde eu moro. Ou 960 famílias se cada lote tiver 500 m2 ou mesmo 1920
famílias, se os lotes forem de 250 m2 como no centro da cidade. Isso certamente
vai provocar impactos na infraestrutura existente na cidade, que já é bastante
deficiente, seja no consumo de água e produção de esgoto, lixo, na demanda por
creche, escola, postos de saúde e hospital, transporte, bancos e correio que
estão sempre lotados, parques e áreas de lazer que já são poucos.
Dois vereadores demonstraram sua
preocupação com a preservação ambiental, em especial das áreas verdes nas
nascentes e margens de córregos que passam por ali.
Em mais ou menos uma hora a audiência
havia terminado e eu estava voltando para casa e me perguntando: audiência
pública é isso mesmo?
Em casa, fui pesquisar melhor sobre o assunto. Descobri
um boletim muito interessante, publicado pelo Instituto Polis (http://www.polis.org.br/uploads/1042/1042.pdf)
que explica que “A Audiência Pública é um instrumento de participação popular,
garantido pela Constituição Federal de 1988 e regulado por Leis Federais,
constituições estaduais e leis orgânicas municipais. É um espaço onde os
poderes Executivo e Legislativo ou o Ministério Público podem expor um tema e
debater com a população sobre a formulação de uma política pública, a
elaboração de um projeto de Lei ou a realização de empreendimentos que podem
gerar impactos à cidade, à vida das pessoas e ao meio ambiente.”
Explica também que o órgão competente, neste caso a Câmara
Municipal, precisa divulgar com a máxima antecedência no Diário Oficial e em
outros meios de comunicação como jornais, televisão, etc. o edital com a data,
o horário, a forma como será feita a disponibilização de informações e o local
acessível para a realização da Audiência.
Êpa! Espera aí! Eu só tive notícia da audiência no perfil
do vereador, no sábado anterior de manhã. Procurei no site da prefeitura, e
nada. No da Câmara Municipal, também nada. No perfil da prefeitura na rede
social, e nada. Lá na entrada da Câmara peguei um jornal da quinta feira
anterior e, com a ajuda de um vereador que foi me cumprimentar e eu reclamei
que não tinha sido divulgado em lugar nenhum, encontrei o edital na penúltima folha.
Aqueles que começam assim: “O presidente da Câmara Municipal de Itupeva, Estado de São Paulo,
com fundamento no inciso I do parágrafo 4º da Lei Federal nº ...” e
ninguém consegue mais ler. Isso vale como informação à população? Ah, também
tinha uma faixa na frente da Câmara. Dois ou quatro dias podem ser considerados
como “máxima antecedência”?
Diz também que “O órgão
público deve deixar disponível para consulta pública, com o máximo de
antecedência e acessibilidade, informações a respeito da questão a ser
discutida na Audiência.” Eu, hein!! Até perguntei na internet onde os
projetos de lei estavam disponíveis para a gente tomar conhecimento antes de ir
para a audiência e não tive resposta nenhuma.
O boletim Repente, do Instituto Polis, ressalta que os
participantes “não vão à Audiência apenas para ouvir, mas para questionar, dar
opiniões, buscar informações sobre o tema e pressionar o Estado para que este
seja mais democrático na tomada de decisões, realizando assim o controle
social.”
E orienta: “Para isso, é necessário que os participantes busquem informações, discutam
anteriormente na comunidade, e que já tenham pensado em como vão expor seus pontos
de vista ou dúvidas a respeito da questão discutida.” Nossa!! Eu não vi
nenhuma associação de bairro se manifestar na audiência. Nenhuma organização da
cidade. Nem representantes dos Conselhos Municipais de Defesa do Meio Ambiente
e de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente, que analisaram os projetos antes
de ir para a Câmara e aprovaram com a ressalva de garantirem a preservação
ambiental.
Senti uma falta danada de ter organizações de bairro,
ambientalistas, de desenvolvimento da cidadania, etc., fortalecidas e atuantes
na cidade.
Eu vou ler outras coisas que vi no boletim, Leis
Federais: http://www.planalto.gov.br; Resolução
do Conselho Nacional das Cidades: http://www.cidades.gov.br;
Boletim Dicas – Idéias para a Ação Municipal nº 229: “Realizar Audiências
Públicas no Município”– disponível em http://www.polis.org.br;
Nelson Saule Júnior – “A participação dos cidadãos no controle da Administração
Pública” – Pólis Papers, São Paulo, novembro de 1998 – disponível em http://www.polis.org.br, mas seria muito bom
se tivesse algumas pessoas dispostas para ler junto comigo e começar a falar
sobre isso na cidade.
Fiquei sabendo também que uma Audiência Pública não é
válida, entre outras coisas, quando “falta divulgação prévia e em tempo razoável das informações sobre
o tema a ser discutido.” Ihhh! Então não valeu, né?