No livro Associação é para fazer juntos,
logo após a fundação da Associação Jequitibá, os diretores se reunidos se
perguntaram “o que nós vamos fazer com
essa ferramenta que temos na nossa mão? Quais são as coisas mais importantes
que precisamos ajudar a resolver para melhorar a vida na nossa comunidade? O
que nós vamos fazer para resolver, ou pelo menos diminuir, esses problemas?”
No mês de março passado, assessorei a
fundação das associações indígenas Sawara, do povo Apiaká e Dace, do povo
Munduruku, no Norte do Mato Grosso e sul do Pará, respectivamente. Nos dias 08
a 16 deste mês de abril, voltei a trabalhar com eles, além da Associação
Indígena Kawaip Kayabi, com quem facilitei um diagnóstico organizacional,
reforma do estatuto e encaminhamento de providências para resolver algumas
pendências contábeis, para tentar responder a essas perguntas.
Os dirigentes das associações Sawara e
Dace continuam providenciando as informações e documentos necessários para o
registro da Ata de Fundação e do Estatuto no cartório. Enquanto isso,
realizamos o Módulo I da Capacitação em Elaboração de Projetos, sobre
Diagnóstico e Planejamento Participativos.
Tratamos do conceito de diagnóstico e
da importância da sua realização para identificar a conhecer bem os problemas
da comunidade. Para isso, lançamos mão de algumas metodologias de Diagnóstico
Rápido Participativo, como a Chuva de Ideias, Entrevista Semi Estruturada,
Mapeamento Participativo, Perfil Histórico, Calendário Sazonal e Caminhada Transversal.
Foi ressaltada a necessidade de ser participativo porque “o paciente é a melhor pessoa para falar sobre o seu problema. Não
é o médico que diz o que a pessoa está sentindo...”. Além disso, o
comprometimento e envolvimento dos associados será muito maior se participarem
e forem ouvidos a partir da discussão dos problemas e buscarem juntos a melhor
solução.
Fizemos um exercício de Chuva de
Ideias, levantando problemas reais das aldeias ali representadas, trabalhamos a
sua formulação para que ficassem bem claros e fizemos a priorização, levando em
conta: qual é o mais grave, que mais ameaça a vida ou a qualidade de vida
das pessoas; o que atinge o maior número de pessoas e o que está relacionado ao
maior número de outros problemas. Essa definição foi antecedida em
vários casos por uma discussão do problema, que pode ser conseguida com a
Entrevista Semi Estruturada, individual ou em grupo focal, além das outras “ferramentas
de diagnóstico”.
Nas oficinas com as duas associações
recém fundadas, perguntei aos dirigentes o que fariam agora. Nenhum deles soube
me responder. Comentei que não sabiam o que fazer porque não haviam feito um
planejamento. Nas assembleias de eleição de diretoria, costumo sugerir que além
da eleição, façam também um rápido diagnóstico e planejamento, para que os
eleitos tenham um Plano de Trabalho, definido em conjunto com os associados,
para conduzir as ações da associação. Nesses casos, foi feita apenas a
aprovação da proposta de estatuto e eleição das coordenações e conselhos,
porque nossa próxima atividade seria esta oficina.
Esta constatação e reflexão iniciou a
sensibilização sobre a importância do planejamento. Refletimos também que
planejar é uma condição para todas as atividades que realizamos no dia a dia,
mesmo que de forma intuitiva e não sistemática. Perguntei como se preparavam
para caçar. Responderam que combinavam com um grupo quando fariam, precisariam
de arma, munição... Perguntei para que caçavam. Tiveram inicialmente dúvidas de
como responder à pergunta óbvia para eles: “Você
faz cada pergunta sem rumo...” Insisti na pergunta e responderam: “Para comer, ora.” Esclareci que algumas
perguntas poderiam parecer sem utilidade porque eles fazem isso desde crianças
e planejam intuitivamente. Então, começamos a trabalhar sobre as perguntas que
fazemos para planejar:
• “Para quê?”, que nos
ajuda a definir o objetivo (conseguir comida) e o resultado esperado (carne
suficiente para alimentar a família);
• “O quê?”: caçar;
• “Com o quê”: armas,
munição;
• “Quando?”: o dia e
hora em que irão caçar;
• “Quem?”: a pessoa
que está organizando a caçada;
• “Com quem?”: as
pessoas que irão junto.
Foi apresentado e explicado um modelo
de Matriz de Planejamento e os participantes, divididos em grupos, fizeram o
planejamento para solucionar alguns dos problemas levantados no diagnóstico.
Foi lembrado que “a
associação, em suas atividades, deve valorizar as potencialidades que a
comunidade tem e aproveitar as oportunidades existentes e outras que podem ser
conseguidas.”
Pelos depoimentos dados, acredito que
a oficina tenha cumprido o seu papel de sensibilizar o grupo de participantes,
formado por dirigentes, conselheiros e associados para a importância do
diagnóstico e planejamento participativos: “vale a pena pensar
para fazer as coisas, porque se não pensar direito, dá errado; não é fácil
fazer planejamento, mas aos poucos a gente vai aprendendo para fazer bem feito
e não dar errado; a gente nunca teve associação e nunca fez esse trabalho. Não
é fácil. É preciso ter muita força de vontade e paciência. É difícil, mas não é
impossível; com planejamento a gente faz bem o nosso trabalho. Em cima da hora
dá tudo errado.”
Foram
orientados a fazer o diagnóstico e o planejamento participativos em suas
aldeias antes do próximo módulo da capacitação que será sobre elaboração de
projetos e captação de recursos. O treinamento sobre a elaboração de projetos
será feito com base nos planejamentos feitos. Serão apresentados editais
abertos na ocasião e os projetos poderão ser encaminhados para financiamento,
começando a viabilizar financeiramente as atividades das associações. Além
disso, a sistematização dos planejamentos feitos nas aldeias, poderá compor o
Plano de Trabalho das associações Apiaká e Munduruku para este primeiro período
de suas existências ou para o mandato da próxima coordenação da associação
Kayabi, a ser eleita em breve.
Depois da
animação da fundação das associações, estão percebendo que as soluções não
virão facilmente, mas como fruto de um trabalho longo, a ser feito com
dedicação e paciência. O bom é que parecem dispostos a isso. Espero que esse
processo não seja atropelado por algum “salvador da pátria”, oferecendo soluções
rápidas como “projetos de gabinete” para “conseguirem logo dinheiro para a
associação”, como se a questão fosse só dinheiro...
Nenhum comentário:
Postar um comentário