Cidadania também é para fazer juntos!

CIDADANIA TAMBÉM É PARA FAZER JUNTOS!

Associação é para fazer juntos. O título desta publicação, lançada pelo IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil, no início de dezembro de 2011, já exprime o que será tratado em seus capítulos: que a criação de uma associação deve ser resultado de um processo coletivo e sua atuação deve ser marcada também pela participação efetiva de seus associados.


É o resultado de 10 anos de trabalho com organizações comunitárias e regionais indígenas, quilombolas, de ribeirinhos, agricultores familiares e outros, aprofundando e atualizando o que já foi publicado anteriormente em Gestão de associações no dia-a-dia.

Este blog nasceu como um espaço para troca de conhecimentos e experiências de quem trabalha para o desenvolvimento de organizações comunitárias e outras.

A partir de 2018 passou a ser também um espaço para troca de ideias e experiências de fortalecimento da cidadania exercida no dia-a-dia, partilhando conhecimento e reflexões, produzindo e disseminando informações, participando de debates, dando sugestões, fazendo denúncias, estimulando a participação de mais pessoas na gestão das cidades onde vivem.

Quem se dispuser a publicar aqui suas reflexões e experiências pode enviar para jose.strabeli@gmail.com. Todas as postagens dos materiais enviados serão identificadas com o crédito de seus autores.

É estimulada a reprodução, publicação e uso dos materiais aqui publicados, desde que não seja para fins comerciais, bastando a citação da fonte.

José Strabeli




sábado, 18 de abril de 2015

Fundamos a associação. E agora, fazemos o quê?

No livro Associação é para fazer juntos, logo após a fundação da Associação Jequitibá, os diretores se reunidos se perguntaram “o que nós vamos fazer com essa ferramenta que temos na nossa mão? Quais são as coisas mais importantes que precisamos ajudar a resolver para melhorar a vida na nossa comunidade? O que nós vamos fazer para resolver, ou pelo menos diminuir, esses problemas?”

No mês de março passado, assessorei a fundação das associações indígenas Sawara, do povo Apiaká e Dace, do povo Munduruku, no Norte do Mato Grosso e sul do Pará, respectivamente. Nos dias 08 a 16 deste mês de abril, voltei a trabalhar com eles, além da Associação Indígena Kawaip Kayabi, com quem facilitei um diagnóstico organizacional, reforma do estatuto e encaminhamento de providências para resolver algumas pendências contábeis, para tentar responder a essas perguntas.

Os dirigentes das associações Sawara e Dace continuam providenciando as informações e documentos necessários para o registro da Ata de Fundação e do Estatuto no cartório. Enquanto isso, realizamos o Módulo I da Capacitação em Elaboração de Projetos, sobre Diagnóstico e Planejamento Participativos.

Tratamos do conceito de diagnóstico e da importância da sua realização para identificar a conhecer bem os problemas da comunidade. Para isso, lançamos mão de algumas metodologias de Diagnóstico Rápido Participativo, como a Chuva de Ideias, Entrevista Semi Estruturada, Mapeamento Participativo, Perfil Histórico, Calendário Sazonal e Caminhada Transversal. Foi ressaltada a necessidade de ser participativo porque “o paciente é a melhor pessoa para falar sobre o seu problema. Não é o médico que diz o que a pessoa está sentindo...”. Além disso, o comprometimento e envolvimento dos associados será muito maior se participarem e forem ouvidos a partir da discussão dos problemas e buscarem juntos a melhor solução.

Fizemos um exercício de Chuva de Ideias, levantando problemas reais das aldeias ali representadas, trabalhamos a sua formulação para que ficassem bem claros e fizemos a priorização, levando em conta: qual é o mais grave, que mais ameaça a vida ou a qualidade de vida das pessoas; o que atinge o maior número de pessoas e o que está relacionado ao maior número de outros problemas. Essa definição foi antecedida em vários casos por uma discussão do problema, que pode ser conseguida com a Entrevista Semi Estruturada, individual ou em grupo focal, além das outras “ferramentas de diagnóstico”.

Nas oficinas com as duas associações recém fundadas, perguntei aos dirigentes o que fariam agora. Nenhum deles soube me responder. Comentei que não sabiam o que fazer porque não haviam feito um planejamento. Nas assembleias de eleição de diretoria, costumo sugerir que além da eleição, façam também um rápido diagnóstico e planejamento, para que os eleitos tenham um Plano de Trabalho, definido em conjunto com os associados, para conduzir as ações da associação. Nesses casos, foi feita apenas a aprovação da proposta de estatuto e eleição das coordenações e conselhos, porque nossa próxima atividade seria esta oficina.

Esta constatação e reflexão iniciou a sensibilização sobre a importância do planejamento. Refletimos também que planejar é uma condição para todas as atividades que realizamos no dia a dia, mesmo que de forma intuitiva e não sistemática. Perguntei como se preparavam para caçar. Responderam que combinavam com um grupo quando fariam, precisariam de arma, munição... Perguntei para que caçavam. Tiveram inicialmente dúvidas de como responder à pergunta óbvia para eles: “Você faz cada pergunta sem rumo...” Insisti na pergunta e responderam: “Para comer, ora.” Esclareci que algumas perguntas poderiam parecer sem utilidade porque eles fazem isso desde crianças e planejam intuitivamente. Então, começamos a trabalhar sobre as perguntas que fazemos para planejar:

       “Para quê?”, que nos ajuda a definir o objetivo (conseguir comida) e o resultado esperado (carne suficiente para alimentar a família);
       “O quê?”: caçar;
       “Com o quê”: armas, munição;
       “Quando?”: o dia e hora em que irão caçar;
       “Quem?”: a pessoa que está organizando a caçada;
       “Com quem?”: as pessoas que irão junto.

Foi apresentado e explicado um modelo de Matriz de Planejamento e os participantes, divididos em grupos, fizeram o planejamento para solucionar alguns dos problemas levantados no diagnóstico.

Foi lembrado que “a associação, em suas atividades, deve valorizar as potencialidades que a comunidade tem e aproveitar as oportunidades existentes e outras que podem ser conseguidas.”

Pelos depoimentos dados, acredito que a oficina tenha cumprido o seu papel de sensibilizar o grupo de participantes, formado por dirigentes, conselheiros e associados para a importância do diagnóstico e planejamento participativos: “vale a pena pensar para fazer as coisas, porque se não pensar direito, dá errado; não é fácil fazer planejamento, mas aos poucos a gente vai aprendendo para fazer bem feito e não dar errado; a gente nunca teve associação e nunca fez esse trabalho. Não é fácil. É preciso ter muita força de vontade e paciência. É difícil, mas não é impossível; com planejamento a gente faz bem o nosso trabalho. Em cima da hora dá tudo errado.”

Foram orientados a fazer o diagnóstico e o planejamento participativos em suas aldeias antes do próximo módulo da capacitação que será sobre elaboração de projetos e captação de recursos. O treinamento sobre a elaboração de projetos será feito com base nos planejamentos feitos. Serão apresentados editais abertos na ocasião e os projetos poderão ser encaminhados para financiamento, começando a viabilizar financeiramente as atividades das associações. Além disso, a sistematização dos planejamentos feitos nas aldeias, poderá compor o Plano de Trabalho das associações Apiaká e Munduruku para este primeiro período de suas existências ou para o mandato da próxima coordenação da associação Kayabi, a ser eleita em breve.


Depois da animação da fundação das associações, estão percebendo que as soluções não virão facilmente, mas como fruto de um trabalho longo, a ser feito com dedicação e paciência. O bom é que parecem dispostos a isso. Espero que esse processo não seja atropelado por algum “salvador da pátria”, oferecendo soluções rápidas como “projetos de gabinete” para “conseguirem logo dinheiro para a associação”, como se a questão fosse só dinheiro...

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