Já
tratamos aqui como é limitador e equivocado pensar que as associações são
criadas para conseguir dinheiro através de projetos. Projetos viabilizam
recursos e recursos são meios para desenvolver atividades, necessárias para
atingir objetivos. Por outro lado, já tratamos também como a elaboração de
projetos pode contribuir para o desenvolvimento organizacional de associações,
ao proporcionar oportunidade para refletir sobre seus objetivos, estratégias de
trabalho, organização interna e relacionamento com as comunidades. Da mesma
forma, a execução de projetos também tem uma grande contribuição a dar,
dependendo de como ela é feita e da relação estabelecida com os parceiros.
Nesta
semana, de 11 a
14 de novembro, estive reunido com diretores da Associação dos Povos Indígenas Tiriyó,
Kaxuyana e Txikuyana – APITIKATXI, caciques e outras lideranças, além da equipe
do Iepé Instituto de Pesquisa e Formação Indígena em Macapá, que me convidou
para esse trabalho, para iniciar a organização da execução de um projeto liderado
pela APITIKATXI, que envolve 4 Terras Indígenas e 7 povos, com suas 5
associações.
A
execução do projeto “Construindo nossos PGTAs: Mobilização e Diagnóstico
Socioambiental na TIs Parque do Tumucumaque, Paru d’Este, Trombetas/Mapuera e
Nhamundá/Mapuera”, financiado pelo Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas
– PEDPI, do Ministério do Meio Ambiente, é um desafio para a APITIKATXI que,
nos seus 9 anos de existência, executou alguns projetos de forma intermitente;
tem uma diretoria relativamente nova, não tem funcionários e tem contado com o
apoio de parceiros, em especial o Iepé e Equipe de Conservação da Amazônia -
ECAM para a sua manutenção e para realizar suas atividades quotidianas.
Inicialmente
fizemos uma reunião com algumas pessoas do Iepé e diretores da APITIKATXI, para
alinhamento da pauta. Nos outros três dias se juntaram a nós alguns caciques e
lideranças.
A
primeira atividade foi tornar o projeto conhecido por todos. Com calma, fazendo
tradução para os caciques e interrompendo sempre que necessário para aprofundar
a discussão, foi feita a leitura do projeto.
Esclarecemos
as exigências do financiador para a execução técnica e financeira do projeto,
destacando como seriam feitos os desembolsos, que os recursos só podem ser
utilizados para despesas que constam no orçamento, a necessidade de fazer
licitação e de ter comprovantes de despesas válidos contábil e legalmente.
Comprovando
que o contador é também um assessor contábil, contamos com a presença da
contadora da associação para esclarecer os procedimentos, encargos e benefícios
que devem ser pagos para a contratação do assistente administrativo. Um Termo
de Referência foi elaborado coletivamente para receber currículos; uma comissão
de seleção foi formada com o Cacique Geral, o presidente da associação e dois
da equipe do Iepé. Foi bastante discutida a necessidade de definir bem o perfil
profissional e fazer uma boa seleção, não cedendo à tentação de contratar
alguém porque é parente ou amigo, para ter um funcionário realmente adequado
para desenvolver bem as atividades.
Um
projeto sempre tem um impacto em uma associação. Foi feita a divisão de tarefas
entre os presidente e o tesoureiro: quem faz a articulação com as organizações
parceiras e demais associações indígenas, quem cuida da administração e
supervisiona o trabalho do assistente, para que possam também continuar com as
outras atividades da associação. Foram definidos o local, equipamentos e
materiais necessários para o trabalho do assistente.
Foi
preparada a próxima reunião, que contará com a presença também de diretores e
lideranças das outras 4 associações indígenas envolvidas com o projeto e
organizações parceiras, governamentais e não governamentais, para que o
envolvimento delas seja também qualificado e para que a governança seja
definida coletivamente.
Muitas
vezes uma associação entra só com o nome em um projeto. Na verdade, quem
escreveu, negociou com o financiador e irá coordenar a execução é uma
organização “apoiadora”. Ao final, a associação tem apenas mais um projeto para
incluir nas suas experiências. Resultado bem diferente é conseguido quando
participa efetivamente de todas as fases de sua execução. É uma excelente
oportunidade para amadurecimento. Nesta mesma reunião foi definido qual é o
papel da APITIKATXI e qual é o papel dos parceiros e mesmo o meu como
consultor.
O
assistente administrativo, mesmo que tenha experiência nesse trabalho,
precisará aprender, por exemplo, como se prepara a logística de uma reunião ou
oficina com a APITIKATXI, com as associações indígenas e organizações
parceiras. É diferente de outros lugares e organizações. Então, principalmente
para a reunião de abertura, em fevereiro do ano que vem, vai contar com ajuda
de quem já tem experiência, depois que for aprendendo pode ir fazendo sozinho.
Vai pedir ajuda só quando precisar. Mesmo que já tenha feito prestação de
contas de outros projetos, vai precisar aprender como fazer a prestação de
contas deste projeto para o PDPI. Cada projeto e com cada financiador é
diferente. Principalmente nas primeiras cotações de preços, compras, pagamentos
e prestação de contas, vai ter alguém para fazer junto, para aprender. Depois
vai fazendo sozinho. Vai ter alguém à disposição para tirar dúvidas ou ajudar
quando for preciso. No final, talvez só seja necessário conferir o que já foi
feito. Tanto a APITIKATXI como as demais associações vão contar com a minha
assessoria em alguns momentos em que ela for necessária. Isso vai ser definido
na próxima reunião.
Não precisar mais da organização parceira para tarefas
administrativas, captação de recursos, entre outras, não significa que não
precisa mais de parceria com ela. Significa que está deixando de depender e
passando a trabalhar junto. Viabilizar recursos, projetos, fazer documentos,
organizar atividades é “pegar na mão e ir ajudando a fazer as coisas, como os
pais fazem com as crianças”. Parceiro não é como pai e mãe cuidando de filho. É
como marido e mulher: são adultos, cada um sabe e pode fazer uma coisa
diferente e, juntos, conseguem o que precisam e atingem seus objetivos. Esse é
o grande aprendizado que a APITIKATXI pode ter com esse projeto: se organizar
melhor, aprender a fazer as coisas, ganhar autonomia e ser um parceiro mais
forte, inclusive para o Iepé. Vai ser muito bom para o Iepé ter uma associação
indígena forte para trabalhar em parceria em muitas coisas que podem ser feitas
aqui na região.
Concordando, o presidente da associação disse que acha
muito importante aprender que devem depender menos dos outros: “Um pai que cuida do filho 10 anos, 20 anos,
30 anos, uma hora fica cansado e não quer cuidar mais. Por isso, precisamos ir
levantando, andando devagar e, aos poucos, andar sozinhos”.
Gostei da postagem!!!Penso em utilizar algumas das postagens do blog como material didático na oficina de Organização e gerenciamento das associações. Gosto muito dessa forma simples e clara de texto.
ResponderExcluirFico muito feliz que esse material possa ser utilizado para o desenvolvimento de outras organizações. Fique à vontade para utilizar as postagens. Gostaria que, quando utilizar, envie um relato para continuarmos partilhando e esse conhecimentos e experiências. Abraço,
ExcluirMais uma excelente aula do Professor Strabeli. Valeu!
ResponderExcluirMuito obrigado! Mas gostaria de esclarecer que um trabalho assim não é possível de ser feito sozinho. Foi bom, de fato, porque o Iepé e a APITIKATXI, que promoveram a reunião, estiveram muito dispostos a isso e os participantes fizeram o principal. Eu só mostrei o caminho. Todos mandaram muito bem!!! Valeu!!!
ResponderExcluir