Nos dias 16 a
21 de março foi dado prosseguimento ao processo de fundação das associações dos
povos indígenas Apiaká e Munduruku da região do Baixo Rio Teles Pires, no norte
do Mato Grosso e Sul do Pará. Digo que foi um processo porque, além dos anos em
que eles tem conversado sobre a importância de terem a sua organização formal,
desde dezembro de 2014 estamos conversando sobre isso, conforme já relatado nas
postagens “Como fundar uma associação – Partes I e II”
A proposta de Estatuto foi elaborada
em conjunto com um grupo de lideranças, a partir de um modelo, que foi
discutido artigo por artigo para respeitar a vontade, particularidades
culturais e sociais de cada povo, aproveitando a reflexão feita anteriormente
em uma oficina sobre associativismo sobre os objetivos e estrutura
administrativa.
Na Aldeia Mayrowi, do povo Apiaká, a
mobilização da comunidade para a Assembleia de Fundação e Eleição da Diretoria,
foi reforçada com a ida de casa em casa dos caciques para entregar um convite e
estimular a ida para a assembleia “para que essa
criança que está para nascer, nasça e cresça forte, com bastante gente
trabalhando junto”, como dizia um dos caciques, lembrando a metáfora
utilizada nas oficinas. O tempo disponível entre a elaboração da proposta de
Estatuto e a realização da Assembleia foi aproveitado também para combinar com
o diretor e professores da escola indígena para prepararem com grupos de alunos
a apresentação de danças e cantos tradicionais. Os convites pessoais, a
mobilização de crianças e jovens para as danças, o que incluiu se pintarem com jenipapo
e se vestirem tradicionalmente, foram ajudando a animar e mobilizar a aldeia.
A Aldeia Teles Pires, juntamente com
as aldeias próximas, estava bem mobilizada. Sugerimos a apresentação de danças
tradicionais na abertura e encerramento da assembleia, que foi aceita.
Ensaiaram na noite anterior.
Nas duas aldeias, elaboramos a pauta
junto com algumas lideranças e definimos quem conduziria cada um dos itens. A
abertura ficou a cargo dos caciques. A apresentação e discussão da proposta do
estatuto ficou com o presidente da assembleia, que foi escolhido pelos presentes
no início, juntamente com o secretário. Como disse um deles, quando me ofereci
para essa tarefa, se precisassem: “Nós podemos
apresentar e explicar. Nós participamos da elaboração da proposta e sabemos
explicar.” A eleição da diretoria (definida no estatuto como
coordenação) e dos conselhos foi conduzida também pelo presidente da
assembleia, cada um da maneira que julgaram mais conveniente: na Aldeia Mayrowi
já tinham conversado e definido uma chapa, que foi eleita por aclamação; na
Aldeia Teles Pires preferiram a apresentação de candidatos e a eleição secreta
cargo a cargo. O encerramento foi feito pelo Coodenador Administrativo (representante
legal) eleito.
A proposta de estatuto foi apresentada
e discutida artigo por artigo. No caso dos Munduruku, que principalmente os
mais velhos não entendem ou entendem pouco a língua portuguesa, a presidente da
assembleia lia o artigo em português e um jovem traduzia e explicava na língua
Munduruku. A minha intervenção se deu apenas a pedido deles quando não
entendiam bem uma palavra ou um artigo de conteúdo mais jurídico, de difícil
compreensão para eles.
Na Aldeia Mayrowi participaram da
assembleia 48 pessoas. Delas 41 assinaram a lista de presença, tornando-se
assim associados fundadores. Na Aldeia Teles Pires participaram cerca de 150 pessoas
e 118 se associaram como fundadores.
Vejo como bem expressiva do resultado
desse processo e da consequente apropriação por eles da fundação de sua
associação, a fala de uma liderança no final de uma das assembleias: “Essa associação não veio de fora. Não foi o José que trouxe a
associação para a aldeia. Essa é a associação que queremos criar há bastante
tempo. Nós discutimos cada artigo do estatuto, para elaborar a proposta e aqui
na assembleia e ele ficou do jeito que achamos melhor. O consultor só nos
ajudou e orientou no que precisamos. Essa é a nossa associação.”
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