O que diríamos de um padeiro que não consegue fazer
pão, de um agricultor que não consegue produzir, de um advogado que não
consegue ganhar uma causa? E de projetos sociais que se sucedem durante anos e
anos sem provocar mudanças?
Acredito que todos nós conhecemos vários casos de
organizações que elaboram projetos de acordo com editais disponíveis, mas nem
sempre em acordo com a suas verdadeiras aspirações, seu planejamento,
prioridades estabelecidas dentro de uma estratégia de ação. Assim, realizam
atividades, envolvem recursos e pessoas e não atingem resultados ou atingem resultados
muito aquém do esperado. Certa vez conversando com dirigentes de uma
organização que, entre outras coisas, apoia o desenvolvimento de organizações
comunitárias, me perguntaram sobre a adequação de seu trabalho. Respondi que
eles já atuavam naquelas regiões há 10 anos, quais as mudanças que haviam
provocado na vida daquelas pessoas? Dez anos é um bom período para termos pelo
menos alguns resultados concretos. Me responderam que nenhuma mudança. Então
está na hora de rever as estratégias adotadas, não é?
Observo, com espanto, que um número significativo de
pessoas e organizações nem ao menos acreditam na
possibilidade de mudança através de sua atuação, apesar disso estar bem presente
no discurso. Por que continuam, então? Não
seria melhor se dedicarem a algo em que pudessem ser realmente produtivos? Aprendi
ainda na adolescência que a condição para convencermos alguém é estarmos nós
mesmos convencidos e mostrar essa certeza na nossa expressão e no que falamos. Será
que é por isso que se consegue tão pouco resultado em relação ao que é
investido? Em outra ocasião perguntei para coordenadores de programa de uma
organização se eles realmente acreditavam ser possível alcançar os resultados
propostos em um projeto. Um olhou para o outro e me responderam: “Mas você pergunta
cada coisa, né?” Estava respondido. Era apenas uma ideia bonita para convencer
o financiador e é claro que não deu os resultados esperados.
Acredito que as agências
financiadoras, nacionais e internacionais fariam um grande bem para as
organizações do Terceiro Setor e, principalmente, para as comunidades e causas
atendidas ou defendidas por elas, se dessem maior atenção para os resultados
alcançados com os projetos financiados por elas. A realização de atividades,
por si só, não é o bastante. “Cumprir tabela” não é tão difícil assim. Agora,
atingir os objetivos e provocar impacto...
Também tem a questão da inovação. Se estratégias até
então utilizadas não se mostraram eficazes, não será necessário sermos
inovadores e mais ousados? Exigimos novas tecnologias em aparelhos eletrônicos,
novos sabores na culinária, novos modelos e cores para as roupas... Porque nos
projetos nos contentamos em oferecer sempre o mesmo? É impressionante o peso de
cursos, reuniões e publicações nos projetos. Não que não sejam importantes, mas
será que tudo se resolve assim, com palavras faladas ou escritas? Em uma
reunião de equipe que atuava com desenvolvimento comunitário, regularização
fundiária, cadeias produtivas, propus o desafio de ficarmos um ou dois anos sem
fazer encontros, cursos e publicações. No final da reunião a coordenadora local
comentou: “Bom, já que vamos ficar dois anos sem trabalhar...” Não foi isso que
eu propus. "A minha proposta foi pararmos de fazer sempre as mesmas coisas. Vamos deixar de trazer as lideranças para a cidade e vamos nós para
as comunidades e não vai ser só para sentar e conversar. Vamos adotar outras
estratégias que vamos definir juntos. Vamos reinventar o nosso trabalho."
Esse “vício” passa para as comunidades e associações
atendidas por essas organizações. Em um um curso de gestores de projetos para
lideranças comunitárias, percebi que todos os projetos elaborados estavam
baseados principalmente nisso. Até para combater o garimpo ilegal, diminuir a desnutrição
infantil era só o trinômio capacitação-reunião-publicação e brinquei com eles: “Vocês
estão com síndrome de Deus. Segundo a Bíblia, Deus criou o universo só falando:
faça-se isso e acontecia; faça-se aquilo e acontecia. Pensam que a gente
também, é só falar que tudo acontece? Reunião é boa para combinar o que vai ser
feito. Depois temos que fazer. Curso é para a gente adquirir um conhecimento
que estamos precisando, depois temos que usar esses novos conhecimentos.” Depois a coordenadora do curso comentou comigo: "É verdade, a gente só faz reuniões. Será que é por isso que as coisas não mudam?"
É verdade que
novas tecnologias sociais também são criadas, mas muitas inovam mais na forma
que no conteúdo e no alcance de resultados. As inovações de fato são poucas. Consequência
disso, a meu ver, é alcançarmos poucas mudanças em comparação com o volume de
organizações, pessoas e recursos envolvidos.
Não chegaremos a novos destinos trilhando os caminhos que
já foram trilhados antes. Gosto da inspiração inovadora de Lulu Santos:
"Nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia"!!