Cidadania também é para fazer juntos!

CIDADANIA TAMBÉM É PARA FAZER JUNTOS!

Associação é para fazer juntos. O título desta publicação, lançada pelo IEB - Instituto Internacional de Educação do Brasil, no início de dezembro de 2011, já exprime o que será tratado em seus capítulos: que a criação de uma associação deve ser resultado de um processo coletivo e sua atuação deve ser marcada também pela participação efetiva de seus associados.


É o resultado de 10 anos de trabalho com organizações comunitárias e regionais indígenas, quilombolas, de ribeirinhos, agricultores familiares e outros, aprofundando e atualizando o que já foi publicado anteriormente em Gestão de associações no dia-a-dia.

Este blog nasceu como um espaço para troca de conhecimentos e experiências de quem trabalha para o desenvolvimento de organizações comunitárias e outras.

A partir de 2018 passou a ser também um espaço para troca de ideias e experiências de fortalecimento da cidadania exercida no dia-a-dia, partilhando conhecimento e reflexões, produzindo e disseminando informações, participando de debates, dando sugestões, fazendo denúncias, estimulando a participação de mais pessoas na gestão das cidades onde vivem.

Quem se dispuser a publicar aqui suas reflexões e experiências pode enviar para jose.strabeli@gmail.com. Todas as postagens dos materiais enviados serão identificadas com o crédito de seus autores.

É estimulada a reprodução, publicação e uso dos materiais aqui publicados, desde que não seja para fins comerciais, bastando a citação da fonte.

José Strabeli




sábado, 31 de dezembro de 2011

Formas de organização para empreendimentos comunitários

Na oficina com as artesãs indígenas em Macapá (veja postagem abaixo) também foram tratadas algumas formas de organização. Para a comercialização de artesanato na loja do Museu do Índio, a forma como o grupo está se organizando parece suficiente. Porém é preciso pensar como será depois. Há várias formas possíveis de organização, cada uma com algumas vantagens e algumas desvantagens:

Grupo informal

Tem a vantagem de não exigir nenhum tipo de burocracia. No entanto, não pode atender a nenhuma exigência formal, como abertura de conta bancária, nota fiscal de pessoa jurídica, etc.

Um setor dentro de uma associação existente

Dispensa a criação de uma nova organização e todas as implicações decorrentes disso. Muitas organizações indígenas têm um departamento de mulheres. Pode ser aberta uma conta bancária exclusiva para as atividades do departamento e a gestão ser feita pelas mulheres, além de aproveitar a infra-estrutura existente.  Por outro lado, o departamento, suas atividades e patrimônio, incluindo a conta bancária, ficam vinculados à associação. É preciso combinar isso com a diretoria e ter com ela uma relação de confiança.

Associação

Cria uma série de encargos burocráticos, mas dá independência para o grupo de mulheres. De acordo com o Código Civil define que as associações se constituem pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos. Sendo assim, não podem ser criadas com a finalidade, por exemplo, de produzir e comercializar artesanato. As associações podem apoiar o desenvolvimento de atividades econômicas de seus associados e comercializar produtos ou serviços para gerar recursos para a sua manutenção e desenvolvimento das atividades que levem a atingir seus objetivos. Tem acesso a financiamentos não reembolsáveis através de projetos, convênios, etc.

Cooperativa

A Lei 5.764/71 (Cooperativismo) define que: Celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro. Sua finalidade, então, é a produção e comercialização coletivas de produtos ou serviços. É uma sociedade que tem como base a cooperação e, com isso, se adapta muito bem à forma das comunidades organizarem suas atividades. É exigido um mínimo de 20 pessoas para a sua criação. É um empreendimento. O capital necessário para o início do empreendimento será  formado pelos cooperados através de compra de cotas-parte. Ganhos ou perdas serão divididos entre os cooperados. Não tem acesso a financiamentos não reembolsáveis.


Empresa

Uma empresa pode ser criada por duas ou mais pessoas. É exigido um capital social, ou seja a importância necessária para os investimentos iniciais para o funcionamento da empresa, formado por quotas de ações compradas pelos sócios. Diferente das associações e das cooperativas, uma empresa é uma união de capital, de dinheiro. Tem mais poder de decisão quem possui o maior número de ações. Não é democrática dando igual poder de decisão para cada pessoa, como as outras formas de organização. Não é interessante introduzir nas aldeias o exercício do poder econômico. Também seria muito complicado ter dezenas de sócios de diferentes aldeias. Não parece ser uma forma de organização adequada para as mulheres indígenas.

Foi sugerido que neste primeiro momento, até a venda na loja a ser montada durante a exposição no Museu do Índio, permaneçam como grupo informal.  Depois podem decidir se preferem criar um departamento em uma associação já existente ou criar uma associação própria. Depois que a produção e comercialização de artesanato estiver mais amadurecida, tiverem conquistado o mercado e um volume considerável de negócios, Poderão pensar na criação uma cooperativa.

Foi ressaltado que, neste momento, o importante é conhecerem e entenderem as vantagens e desvantagens de cada forma de organização. A decisão deve ser tomada depois que as demais mulheres estiverem integradas à atividade e amadurecerem bem a idéia. Não devem tomar uma decisão apressada.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Oficina de gestão administrativa e financeira para artesãs indígenas em Macapá-AP

Neste mês de dezembro fui facilitador em Macapá-AP de uma oficina de gestão administrativa e financeira para um grupo de mulheres indígenas, de várias etnias, da Terra Indígena do Parque do Tumucumaque. Promovida pelo Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena, a oficina é uma das atividades do projeto Tecendo a Arte, Tecendo a Vida, financiado pela Caixa Econômica Federal.

As Artesãs do Tumucumaque fazem um artesanato belíssimo com miçangas e com maramara (uma semente típica da região), desde peças tradicionais usadas em festas até bolsas, porta-caneta e porta-celular. Ainda não comercializam sistematicamente: fazem pequenas vendas eventuais e, recentemente, venderam dezenas de peças para o acervo do Museu do Índio, do Rio de Janeiro. Querem gerar renda, fortalecer a cultura entre os mais jovens e difundi-la para não indígenas.

A oficina teve como objetivo organizar melhor o grupo, definir preço, controles de compra e venda de artesanato e materiais, de estoque e financeiro e buscar alternativas de mercado para tornar a atividade constante.

O Museu do Índio vai expor as peças adquiridas delas de junho a agosto de 2012. Na ocasião, vai montar um ponto de venda no próprio museu. Ofereceu as miçangas, linhas e agulhas para que possam produzir e vender durante aqueles meses.

A oficina se propôs a prepará-las para esta demanda imediata, o que, ao mesmo tempo, prepararia para a continuidade da atividade depois de terminada a exposição.

Um aspecto importante foi explicar a necessidade de terem um capital de giro para não dependerem sempre de doações de materiais e pagarem à vista as artesãs. Foi proposto aproveitarem a doação do museu: se descontassem do preço da venda o valor dos materiais poderiam ter o retorno do capital para comprar novos materiais e peças para a venda. Também foi ressaltada a importância de preverem o pagamento de despesas administrativas como embalagens, etiquetas, emissão de nota fiscal, etc.

Entenderam bem o que é capital de giro quando foi dito que “é o karakuri (dinheiro) que vai passear e volta” para ser novamente investido na produção, o que vai sendo feito indefinidamente. Para quebrar a resistência inicial ao pagamento dos materiais utilizados, o que não tem sido feito até agora, foi explicado que todas as atividades tem um custo. Um comerciante não fica com todo o dinheiro que consegue com a venda das mercadorias. Precisa comprar novas mercadorias para vender, pagar funcionários, impostos, embalagens, entre várias outras despesas. A produção e comercialização de artesanato também tem custos: miçanga, agulha, linha e algumas despesas administrativas.

Para ficar mais claro, foi simulado todo o processo, desde a aquisição dos materiais até a venda e o pagamento da mão de obra, dos materiais e da administração. Usando dinheiro fictício ficou bem claro “para onde vai o dinheiro da venda”.

Foi feita a composição de preço de várias peças com a participação efetiva delas dizendo quanto gastavam de material e quanto avaliavam ser justo receber pelo seu trabalho.

Treinaram a elaboração manual e com planilha eletrônica dos controles de retirada e pagamento de materiais, entrega e pagamento de artesanato, estoque e financeiro.


Dividiram entre si as tarefas para organizar o trabalho em Macapá e nas aldeias e quais seriam as atribuições de cada grupo.

Foi incluída na programação inicial, a pedido delas, uma simulação de venda para se familiarizarem com a forma de abordar os clientes, oferecer os produtos e vencerem a timidez que têm neste momento.

Apesar de terem muita dificuldade com a língua portuguesa e com a matemática, além de grande parte do grupo estar tomando conhecimento desses temas pela primeira vez, ficaram bem animadas com o que aprenderam e deixaram claro que vão precisar de apoio e mais oportunidades de aprendizado para gerirem de forma autônoma sua atividade.

Outro fator importante é que o Iepé deixou claro desde o início da oficina que dará todo o apoio e assessoria necessário, mas não assumirá tarefas que são delas, já que “O objetivo principal é proporcionar a criação de um espaço de promoção social e econômica, protagonizado e organizado por estas mulheres.”