Itupeva, no interior de São Paulo, tinha uma Tribuna Livre
na Câmara Municipal, onde a cada sessão dois cidadãos – pessoas com domicílio
eleitoral na cidade – poderiam ocupar a tribuna por 5 minutos para expressar a
sua opinião sobre temas relevantes para a cidade.
Parte do chamado pequeno expediente, os cidadãos poderiam
opinar inclusive sobre projetos de lei que fossem votados na mesma sessão, em
seguida, no grande expediente.
Não eram muitas, mas algumas pessoas vinham ocupando a
Tribuna para manifestar sua insatisfação com a administração municipal,
principalmente em áreas fundamentais como a saúde e educação e a ausência de
fiscalização e providências legais por parte dos vereadores; a aprovação de
qualquer medida proposta pelo prefeito pela maioria dos integrantes da Câmara;
a falta de produtividade em termos de projetos de lei de iniciativa dos nossos
representantes.
Mas, esse espaço de expressão dos cidadãos no Legislativo
Municipal, também chamado de “A Casa do Povo”, morreu na prática com uma
mudança no Regimento Interno da Câmara feita no final de 2020 quando os
vereadores de então restringiram seu acesso à “manifestação de lideranças
comunitárias e representantes da sociedade civil organizada, para apresentação
de temas de interesse geral ou coletivo dos munícipes”, de acordo com o artigo
85, parágrafo 5º, já no grande expediente.
A partir de então, além de comprovar estar no gozo de seus direitos políticos, a pessoa interessada deve comprovar também que é “representante legal ou pessoa credenciada por Associação de moradores de bairro legalmente constituída neste Município; Entidade sindical ou associação profissional com sede neste Município; ou Entidade declarada de utilidade pública pelo Município.
Um dos argumentos para a aprovação dessa mudança foi “organizar melhor o uso da Tribuna Livre para serem tratados assuntos coletivos e não particulares, dando prioridade para os representantes da sociedade civil organizada.” Nunca foram tratados assuntos particulares e, dada a pouca iniciativa dos “representantes da sociedade civil organizada”, nunca tiveram a sua manifestação atrapalhada pelos cidadãos que a vinham ocupando.
Desde então, nos últimos 3 anos, nunca mais a Tribuna [que não é mais] Livre da Câmara Municipal de Itupeva foi ocupada por nenhum cidadão.
E, por quê?
Primeiro, mudando do pequeno expediente para depois do grande expediente, não é mais possível se manifestar sobre projetos de lei em pauta naquela sessão, na tentativa de influenciar o voto dos vereadores com a vontade popular que eles devem representar, uma vez que as votações já aconteceram.
Segundo, de acordo com uma malfadada tradição política brasileira, a grande maioria das associações de bairro de Itupeva foram criadas ou adotadas por vereadores e, em geral, preferem o caminho mais fácil de pedir favores para seus “padrinhos”, que conseguirão o atendimento por parte do Executivo Municipal em troca de apoio em votações, do que o caminho mais difícil da reivindicação pública de direitos na tribuna da Câmara.
Por último, Itupeva carece de organizações da sociedade civil que não sejam assistenciais, em especial as dedicadas ao fortalecimento da sociedade civil e ao controle social da gestão dos recursos e da execução das políticas públicas e, mesmo que existissem, essas organizações não seriam - e nem precisam ser - declaradas de utilidade pública municipal. Assim sendo, também não teriam acesso ao espaço institucional de manifestação.
Dessa forma, a Câmara Municipal de Itupeva não é a “Casa do Povo”, porque o povo da cidade não tem espaço nela para manifestar a sua opinião.
A população de Itupeva não pode se intimidar diante disso, mas pelo contrário, deve exigir seu espaço constitucional de participação nos debates e decisões importantes para a cidade, de forma individual e, principalmente, organizada. Ao votar em legisladores e administradores municipais, não delegamos a eles a nossa cidadania, mas como nossos representantes precisam nos ouvir.